Fernando Nogueira da Costa[1]

O portal do IE-UNICAMP pode ser aproveitado também como um espaço de compartilhamento de experiências didáticas entre seus professores, socializando o conhecimento a respeito com todos os colegas lusófonos. Nesse sentido, neste post, quero narrar meu aprendizado no curso de Métodos de Análise Econômica na graduação desse Instituto.

Sim, aprendizado, pois tenho comigo que o bom curso é aquele em que a gente, isto é, o professor aprende junto aos alunos. Aliás, desconfio que prossigo dando aulas por causa desse fator motivacional: eu aprendo o que ensino, antes e durante o curso, com as leituras prévias e as interações com os estudantes. Em síntese, o melhor método de aprendizagem é ensinar! Por isso as más línguas (práticas) dizem que, “quem sabe, faz, quem não sabe, ensina”...

Fui convidado a oferecer essa disciplina obrigatória no último semestre na grade da graduação do IE-UNICAMP em 2013. Já acumulei cinco anos de experiência. Cansei da repetição? Não, pois em cada ano incorporei alguma inovação, seja no conteúdo, seja na forma de o ministrar.

Quando me convidou, a coordenadora da graduação me disse que sob esse título se propunha um curso similar ao outrora chamado Política e Planejamento Econômico. Ora, pensei cá comigo, planejamento perdeu mesmo o prestígio a ponto de deixar de nomear uma disciplina para futuros economistas...

Na primeira vez, eu propus aos alunos fazermos uma análise das políticas socioeconômicas e formas de intervenção governamental para regulação de economia de mercado. Usei como método didático, em uma aula, a apresentação de um documentário sobre temática socioeconômica brasileira para, na aula seguinte, referenciar e/ou motivar o debate de possíveis soluções de políticas públicas para os problemas abordados pelo filme.

A intuição e a criatividade dos alunos estiveram envolvidas nesse processo através da ação de pesquisar dados e informações sobre o problema, dimensionando-o, e em seguida analisando se as políticas públicas usadas foram as pertinentes. Assim estimulados, os alunos se moveram em direção à apropriação intelectual do tema apresentado, o que resultou na prática de elaboração mental de Métodos de Análise Econômica.

Inicialmente, apresentei uma Metodologia Econômica para os futuros economistas não cometerem “o vício ricardiano”, isto é, suicidar sua reputação ao saltar do alto de um elevado edifício, construído por abstração, diretamente para o chão duro da realidade concreta. No nível mais elevado de abstração, ensinei, encontra-se a teoria da consistência no uso dos instrumentos de política econômica. Seu conhecimento é pré-requisito, não é o fim do caminho profissional.

É prudente descer da teoria pura para a aplicada, passando pelo nível intermediário em que se reincorpora os conflitos de interesse antes abstraídos. Nesse patamar, é necessário estabelecer contatos com outras áreas de conhecimento: Política, Sociologia, Psicologia, Direito, etc. Estabelecem-se, nas eleições democráticas, a definição do regime macroeconômico como uma característica estrutural do planejamento de desenvolvimento em longo prazo. Ele condiciona o manejo das políticas públicas.

No nível mais baixo de abstração, surge a necessidade de contextualizar, ou seja, datar e localizar os eventos. Só então o economista estará apetrechado para captar os imperativos de dada conjuntura. Demonstrará sua habilidade na arte de tomada de decisões práticas quanto ao uso dos instrumentos de política econômica em curto prazo: política monetária, política fiscal, política cambial, controle de capital.

Depois de pesquisa pelos alunos de informações na internet sobre o Plano Plurianual do Ministério do Planejamento e o andamento do PAC – Plano de Aceleração do Crescimento, seguimos a lógica da história do povo brasileiro: da expropriação das riquezas naturais do território à concentração da riqueza em poucos habitantes. Para discutir a política energética, quanto a investimentos em hidroelétricas e extração de petróleo, assistimos “O Petróleo Tem Que Ser Nosso”, e discutimos a questão da soberania nacional sobre a exploração do pré-sal. Motivei os alunos com “Eliezer Batista, O Engenheiro do Brasil”, cinebiografia do ex-presidente da Companhia Vale do Rio Doce, para eles fazerem apresentação sobre política de mineração.

E assim prosseguimos: “Terra Vermelha” / “Terra dos Índios” tratam da questão indígena no Brasil ou política para os nativos da terra: reservas x riqueza; “Terra Para Rose” / “O Sonho de Rose: 10 Anos Depois”:  política fundiária; “Migrantes”: a migração recente de trabalhadores nordestinos para os campos de açúcar paulista e a política agrária; “Elas da Favela” / “5XFavela: Agora por Nós Mesmos”: relato de moradores do Complexo do Alemão sobre a incursão da polícia naquela comunidade para discutir urbanização de favelas e financiamento habitacional; “Meninas” sobre gravidez na adolescência para tratar de bônus demográfico, natalidade, escolaridade, mercado de trabalho e previdência complementar; “O Aborto dos Outros”, tratando do aborto no Brasil, para apresentar a política de saúde pública: “Notícias de uma Guerra Particular” / “Falcão - Meninos do Tráfico”, retratam a vida jovens de favelas brasileiras que trabalham no tráfico de drogas; “Quebrando o Tabu”, documentário conduzido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre a descriminalização das drogas, e “Justiça”/ “Juízo” são filmes que acompanham a via crucis de menores infratores, propiciando reflexão sobre política de segurança pública, justiça e presídios. “Garotas do ABC”, usando o ABC paulista como cenário, o filme aborda o trabalho, a imigração nordestina, o racismo, o neofascismo e a esperança, portanto, debatemos política de direitos humanos: igualdade racial, diversidade de gêneros, anti-homofobia, etc. “Para O Dia Nascer Feliz” trata dos conflitos e a vida na escola de três jovens de classes sociais diferentes; criou empatia nos alunos para pesquisarem sobre política educacional. Finalmente, “Um Lugar Ao Sol”, um documentário sobre a visão de mundo de pessoas de alto poder aquisitivo que moram em coberturas, motivou o debate sobre política de combate à desigualdade social em renda e riqueza.

Embora esse curso tenha sido muito bem avaliado pelos alunos, eles mudam a cada ano, e eu não gosto de me repetir, seja reler os mesmos livros, seja ver os mesmos filmes. Mudei no ano seguinte. Compartilho as novidades no próximo post.

 

[1] Professor Titular do IE-UNICAMP. Autor de “Brasil dos Bancos” (2012) e “Bancos Públicos no Brasil” (2016). http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.