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Autor:
Wilson Cano

O objetivo deste trabalho é discutir a questão regional brasileira, examinando o processo de integração do mercado nacional, nele destacando a análise do setor industrial.

A periodização compreende os anos de 1930 a 1970 recortada nos subperíodos: 1930/55, quando se altera o padrão de acumulação de capital e ingressamos na industrialização "restringida ", e 1956/70, quando o padrão se altera e são implantadas as industrias produtoras de bens de produção e de consumo durável, a chamada industrialização "pesada". A periodização que uso para o exame da evolução da agropecuária regional é mais flexível, dada suas especificidades, guardando certa relação com a periodização industrial. O ano de 1970, é o último em meu período de análise, apenas porque era, ao tempo em que iniciei esta pesquisa, o último ano censitário.

Este estudo é continuação de trabalho anterior, que compreende o período 1850-1929, e que frutificou, possibilitando um conjunto de trabalhos envolvendo colegas e mestrandos do Departamento de Economia da UNICAMP.

Além do presente texto, que tem como escopo discutir as linhas gerais que nortearam o processo de concentração, outros, sob minha coordenação, foram concretizados ou se encontram em fase final, compreendendo estudos específicos sobre o tema?

Para o período de análise desta tese, abandono o uso da noção de complexo econômico regional, que utilizei na análise anterior a 1930, por julgá-la agora superada, dado que a integração do mercado nacional obriga-me a usar o conceito de economia nacional, sem contudo perder a perspectiva regional. Com a maior intensidade que essa integração atingiu nas últimas décadas, os diferentes espaços regionais passaram a sofrer a ação de dois movimentos: o antigo, decorrente da manutenção de uma estrutura primário-exportadora; e o novo, decorrente da ação comandada pelo centro dominante nacional, via dominação dos mercados e do processo de acumulação de capital. A partir da ruptura da "crise de 1929" já não é mais possível repensar as economias regionais enquanto espaços regionalizados "autônomos", dada a superposição daqueles dois movimentos.

Uma lacuna importante deste trabalho é a ausência de uma investigação aprofundada sobre o papel desempenhado (principalmente após o início da década de 40) pelo setor terciário e pela construção civil. Eles jogaram (e ainda jogam) importante papel na dinâmica de várias regiões. Trata-se, aliás, do reduto preferencial do capital mercantil regional e nacional, que está por merecer estudos mais acurados.

Ao mesmo tempo em que concluí a investigação básica que me permitiu escrever este texto, a equipe de pesquisa de pós-graduação de economia da Universidade Federal de Pernambuco também concluía pesquisa cuja temática era a das desigualdades regionais no Brasil.' Infelizmente, dada sua restringida circulação, não tive acesso senão a dois volumes desse trabalho, razão pela qual não pude utilizá-Io nesta pesquisa.

Como é sabido, há dificuldade, às vezes intransponível, entre o uso de conceitos empregados em economia regional e a informação estatística: região, neste trabalho, em termos de informações estatísticas, se confunde com o espaço contido pelas fronteiras políticas das unidades federadas do país, ou de suas agregações. São Paulo é efetivamente o centro dinâmico da economia nacional, e, assim sendo, em muitas passagens chamo essa região de pólo, inclusive para não me tornar muito repetitivo com expressões tipo "SP", "região paulista", "centro dominante", etc. O conjunto das restantes unidades federadas é aqui denominado "Brasil, exclusive SP", "periferia nacional", ou "Resto do Brasil". Espero que o leitor compreenda que não se trata, no segundo caso, de qualquer tentativa ou lapso de tratar as demais regiões com menosprezo.

O trabalho é constituído de cinco capítulos e de um Apêndice Estatístico. O primeiro é uma introdução à questão regional no Brasil e de sua conscientização política. A argumentação que utilizo para discutir algumas equivocadas teses sobre o tema restringe-se às premissas contidas no discurso de tais teses. A principal tese combatida é a da ação de um suposto imperialismo paulista sabre as economias regionais.

O segundo apresenta as linhas gerais da dinâmica regional brasileira, anteriores à "crise de 1929". Sua função, neste texto, é mostrar ao leitor que a questão regional no Brasil e a concentração industrial em São Paulo têm raízes históricas que antecedem, muito, o período pós-1955, da instalação da indústria pesada no país.

O terceiro e o quarto capítulos compreendem a análise específica da indústria de transformação, tentando captar seu movimento de expansão, mudança estrutural, emprego, produtividade, salários como custo de produção e a geração e apropriação do excedente.

O quinto analisa o processo de integração do mercado nacional, através de suas principais manifestações. Para tentar uma explicação dos fluxos emigratórios inter-regionais, e para comprovar a inexistência de estagnação regional, vi-me obrigado a fazer esforço adicional, estudando o desempenho da produção agrícola, a expansão de sua área cultivada e, principalmente, a importante questão atinente à grande queda da fertilidade natural do solo, que se manifesta nas principais culturas e na maioria absoluta das regiões brasileiras entre 1930 e 1970.

Nesse capítulo, em seu início, esboço uma resumida interpretação sobre a importante década de 20, tratando-a como década de transição para as grandes transformações políticas, sociais e econômicas que se fariam no país, após o movimento revolucionário de 1930. Ainda, retomo questão que, embora tratada por vários autores, mantém pontos controversos importantes. Refiro-me à polêmica crítica feita a Celso Furtado por outros autores, sobre sua clássica interpretação da política econômica de recuperação à crise cafeeira da década de 30.

Esta tese também tem sua história. Seu projeto foi elaborado em 1970. Ao desenvolver o tema, contudo, dei-me conta do muito que havia por fazer em termos da análise do período que a precedia, isto é, do período anterior à "crise de 1929". Em face disso e verdadeira paixão com que abracei este estudo, só pude começá-Io efetivamente a partir de 1976, após defender minha tese doutoral relativa ao período anterior. De 1976 para cá - período em que exerci também a Chefia do Departamento de Economia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP e, posteriormente, a Direção desse Instituto - executei o trabalho de forma um tanto descontínua. À leitura atenta deste texto não escapará esse fato. Os dois primeiros capítulos foram redigidos entre 1979 e 1980; o terceiro e o quarto, ao final de 1980, e o último, por sinal o mais trabalhoso e complexo, demandou o período de janeiro/agosto de 1981.

Essa tarefa foi árdua. Não fora a amizade e a colaboração dos colegas de meu Departamento, teria sido mais difícil. A equipe de pesquisas deu-me apoio básico e imprescindível na tabulação dos dados estatísticos; neste sentido, particularmente agradeço aos colegas Carlos Eduardo Nascimento Gonçalves e José Antônio Saenz. As discussões que fiz com alguns colegas foram de grande valia, principalmente as observações recebidas de Maria da Conceição Tavares, João Manuel Cardoso de Mello e Jorge Miglioli, a quem devo a paciente leitura crítica de todos os capítulos.

Outros colegas fizeram leituras e discussões parciais e, mesmo com o receio de cometer injustiças, agradeço a colaboração crítica de Carlos Eduardo do Nascimento Gonçalves, José Francisco Graziano da Silva, Mário Luis Possas, Paulo Eduardo Baltar, Paulo Renato Costa Souza e Natermes G. Teixeira.

Cláudio França e Guilherme Toledo, pesquisadores do Departamento, também ajudaram na leitura crítica de algumas partes.

Cândida, com sua costumeira dedicação e grande amizade, incumbiu-se da maior parte da datilografia. Embora de praxe, devo dizer que os eventuais erros contidos neste trabalho são de minha exclusiva responsabilidade.

Não poderia deixar de registrar meu sincero agradecimento - agora póstumo' - ao Prof. Zeferino Vaz, construtor da Universidade Estadual de Campinas, a quem devemos não só essa obra física, mas, principalmente, o seu livre exercício do pensar, que sempre cultivou, mesmo diante dos difíceis dias que se seguiram a 1968.

Selma continuou seu insubstituível trabalho: deu-me mais amor e compreensão e, ainda, Eduardo. De Newton e Marcelo, embora pequenos, recebi o grande e imprescindível afeto filial.

Campinas, Chácara das Amoreiras, 12 de agosto de 1981.