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Autor:
Luiz Gonzaga Belluzzo, Renata Coutinho
A idéia de reunir os artigos sobre o desenvolvimento recente da economia brasileira não é nova entre os professores do Departamento de Economia e Planejamento da Universidade de Campinas. O acúmulo de atividades de docência e pesquisa, no entanto, determinou, em várias ocasiões, o adiamento do paciente trabalho de organização do material e convencimento dos autores. Muitos dos artigos estavam esgotados, outros permaneciam esperando as costumeiras e intermináveis revisões dos mais perfeccionistas.

A maioria dos trabalhos aqui apresentados foi escrita em meados da década de 70, quando ainda não estavam claros, para muitos, os contornos da crise e restavam ilusões sobre as possibilidades de uma superação a médio prazo dos desajustes da economia brasileira e mundial.

Esta era a visão que prevalecia nos círculos oficiais e em alguns meios acadêmicos tradicionais. Para esta corrente, a crise irrompeu a partir de um fato exógeno (a quadruplicação dos preços do petróleo em 1973) e a absorção de seus efeitos poderia ser assegurada pela execução de políticas fiscais e monetárias apropriadas. O desenrolar dos acontecimentos vem demonstrando o caráter parcial e insuficiente destes diagnósticos, o que, naturalmente, não impede sua intensa vulgarização e sua transformação em eficiente estratagema de mascaramento dos problemas reais. Esta, aliás, tem sido a função cega do pensamento econômico consagrado.

Keynes dizia, no prefácio da Teoria geral do emprego, do juro e da moeda, que "a dificuldade não reside nas idéias novas, senão em fugir das antigas, que se insinuam pelos escaminhos do entendimento daqueles que, como quase todos nós, receberam a mesma formação." Otimismo imperdoável do grande economista. Hoje em dia, a resistência das idéias velhas não apenas dificulta o entendimento das novas, mas toma impossível qualquer contato - mesmo de primeiro grau - com o mundo existente.
o conjunto de análises publicado neste livro, em dois volumes, procura evitar as armadilhas do pensamento cristalizado, mas faz um esforço para incorporar as contribuições dos autores que formularam hipóteses criativas sobre a natureza e as transformações do capitalismo. O leitor perceberá facilmente a presença de Marx, Schumpeter, Keynes, Kalecki que, a despeito de suas significativas diferenças teóricas, concentraram a atenção sobre "os elementos do processo capitalista que impedem - por seu simples funcionamento e desde dentro - qualquer equilíbrio capaz de estabelecer-se por si mesmo ...; e que produzem 'ondas' cíclicas que são essencialmente a forma que toma o progresso no capitalismo de livre concorrência."

Para todos estes autores a trajetória do capitalismo não se reduz a uma dinâmica cíclica - em que o movimento é uma simples recorrência abstrata de fases de recuperação, auge e declínio - mas supõe um processo de transformação das formas de existência das relações constitutivas da sociedade. A organização da empresa e a natureza dos mercados, as normas de determinação dos salários, a extensão e os métodos de regulação do Estado, enfim o conjunto de condições "institucionais" do capitalismo é subvertida desde dentro na medida em que o sistema reproduz sua estrutura fundamental. Neste sentido, não há, para eles, nem determinismo, nem indeterminação. Há sim, simultaneamente, reprodução e transformação.

Este processo de reprodução e transformação se desenvolve em condições peculiares nos países como o Brasil que chegaram tardiamente à industrialização e que incorporaram de forma extremamente concentrada no tempo os padrões próprios do capitalismo do pós-guerra.

Os efeitos sobre a estrutura de classes, sobre o ritmo de urbanização, sobre os módulos de consumo e certamente sobre os métodos de produção foram intensos e bastante desiguais. O vigor do crescimento e a ampliação da heterogeneidade, em todos os níveis, foram as características deste movimento de metástase do capitalismo que começou a perder forças em meados da década de 70 e entrou em crise aberta no início dos anos 80.

Os artigos deste livro se debruçam sobre estas questões, buscando desvendar as raízes e o destino da economia brasileira, nos estertores de uma das etapas mais brilhantes da expansão capitalista.