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Autor:
Maria da Conceição Tavares

Quero iniciar este trabalho com alguns comentários a que julgo ter direito como professora antiga desta casa e que se destinam a esclarecer o que considero uma orientação fundamental no ensino de Economia, para situar posteriormente minha própria postura teórica nesta tese.

Se se pretende ensinar "Teoria Econômica", pode-se recorrer a qualquer bom autor contemporâneo, a Joan Robinson, Sraffa, Kalecki ou Hicks e Hahn, e retomar, com eles, qualquer das tradições: clássica ou neoclássica (de Ricardo a Marshall, de Wicksell a Walras).

Se se pretende ensinar "Economia Política", pode-se utilizar qualquer pensador que efetivamente tenha se preocupado em entender o capitalismo do seu tempo e que o tenha criticado por dentro, desde os verdadeiros "clássicos", passando por Hobson e Schumpeter, por Keynes e Kalecki, ou mesmo Galbraith. Não para aplicar seu pensamento em forma vulgar, nem para codificá-lo sob pretexto de dar-lhe rigor, mas sim para utilizá-lo em forma livre e pesquisar os problemas que os preocuparam e continuam presentes.

A "Crítica da Economia Política", que voltou à moda ultimamente, requer porém um entendimento mais profundo e "radical" dos problemas do capitalismo contemporâneo. Não se pode usar Marx e alguns de seus poucos grandes seguidores para Convertê-Ios em "economistas" e, muito menos, para empobrecer os seus conceitos mediante uma análise mecânica ou pretensamente científica dos problemas.

A formação analítica de um economista, sobretudo a de um professor e pesquisador, deve passar por todas as tradições e guardar delas a distância necessária, para não ser aprisionada, pelo seu método. Cada um deve refazer por si mesmo, com paciência e audácia, o estilo de análise que lhe parecer mais conveniente na luta pelo conhecimento, na luta por "conhecer o mundo" e "tentar mudá-lo", na medida que lhe permitirem as suas próprias forças e as forças sociais ante as quais se situa.

É a partir desta postura - que sempre adotei em minha vida acadêmica - que pretendo abordar nesta tese alguns problemas de Economia Política contemporânea, particularmente a brasileira.

Escolhi aqueles que sempre me preocuparam e mais de perto tocam a minha capacidade profissional de professora e pesquisadora.

A presente tese desdobra-se em duas partes, cada uma com dois capítulos. A primeira parte é constituída por dois ensaios teóricos, realizados com propósitos distintos. O primeiro ensaio diz respeito a problemas de dinâmica econômica, especialmente aqueles a que se referiram Keynes, Kalecki e Schumpeter e que considero devam ser retomados para completar o movimento da tese em direção ao entendimento da análise do ciclo recente de expansão da economia brasileira e da atual crise. O segundo ensaio é um contraponto à "crítica da economia política" em que pretendo levantar alguns problemas da leitura de O Capital, de Marx. Não o faço com propósitos de exegese, mas para sublinhar minha divergência com certas interpretações neomarxistas e, sobretudo, para apontar em que direção vejo a crise do capitalismo contemporâneo não como uma "profecia de Marx", mas como um desenvolvimento histórico cuja "lógica" pode ser ainda buscada na sua leitura em forma não ritualizada. Os limites do primeiro ensaio são apenas os de minha própria clareza em explicar problemas que levo anos estudando e ensinando.

O primeiro capítulo da segunda palie trata da dinâmica recente da indústria brasileira. A minha visão do ciclo industrial da economia brasileira apoia-se num conjunto de pesquisas realizadas nos últimos três anos, em colaboração com meus companheiros e alunos de Campinas e com os colegas do Centro de Estudos e Pesquisas da FINEP, e que não posso resumir no âmbito desta tese.

Vários trabalhos sobre estrutura industrial estão sendo editados sob responsabilidade coletiva, entre os quais a própria pesquisa realizada na FINEP - Estrutura Industrial e Empresas Líderes - bem como as dissertações de mestrado e teses de doutorado sob minha orientação e versam sobre temas correlatos.' Neste capítulo, apresento apenas o movimento geral do ciclo, cuja parte empírica se apoia também em alguns trabalhos realizados no IPEA/INPES. Ele representa a continuação do esforço de interpretação já realizado em minha tese de livre-docência.

Finalmente, o segundo capítulo retoma meus ensaios anteriores sobre o setor financeiro e resume o movimento do crédito e do dinheiro no ciclo recente, sem o qual não seria possível entender a natureza específica da presente crise.